Apolo, o deus-vidente


Apolo tornou-se o arquétipo do deus-vidente, pois logo ao nascer gritou: «Deem-me a lira e o meu arco curvo, anunciarei aos homens a inflexível vontade de Zeus».  Apolo era consultado como oráculo especialmente em Delfos, o mais célebre da antiguidade, mas também em Delos, Patara ou ainda em Claros, um dos mais conhecidos e que teve como adivinho o célebre Mopso.

Texto de Bira Câmara, extraído do livro “Oráculos, Adivinhação e Profecias na Antiguidade”



A ligação de Apolo com Delfos deve-se ao mito relacionado ao seu nascimento: Zeus tinha como esposa a deusa Hera, mas engravidou a Titânia Leto, que deu à luz Apolo e Artemis; para se vingar, Hera perseguiu-os, incitando Píton, o dragão de Delfos, a ir-lhes no encalço. Outra versão, mais antiga, conta que Apolo dirigiu-se a sua futura morada, em Delfos, mas foi impedido por um dragão fêmea, Píton, e matou-o a flechadas.

Uma predição célebre do oráculo de Apolo foi feita a Filipe, rei da Macedônia: advertido de que seria morto por uma charrete, ordenou que retirassem de seu reino todos os carros. Entretanto, não conseguiu escapar ao destino que o oráculo havia anunciado: Pausânias, que o matou, tinha uma charrete gravada no punho da espada que o atravessou.



Era temido pelos outros deuses e somente seu pai e sua mãe podiam contê-lo. Entre seus inúmeros atributos, tinha o poder da morte súbita, das pragas e doenças, mas também da cura e da proteção contra as forças malignas. Ficou conhecido, além disso, como o deus da Beleza, da Perfeição, da Harmonia, do Equilíbrio e da Razão. Era o iniciador dos jovens no mundo dos adultos, estava ligado à Natureza, às ervas e aos rebanhos, e era protetor dos pastoresmarinheiros e arqueiros. Mas, embora tenha tido inúmeros amores, foi infeliz nessa área, mas teve vários filhos.

Vários animais eram consagrados a Apolo: o galo, o gavião, a gralha, o grilo, o cisne, a cigarra. Entre as árvores, o loureiro, em lembrança de Dafne, e do qual ele fez a recompensa dos poetas, e também a oliveira e a palmeira; entre os arbustos e as flores, o lótus, o mirto, o zimbro, o Jacinto, o girassol, o heliotrópio, etc. As pessoas que chegavam à puberdade consagravam-lhe a cabeleira no seu templo.

Deus ciumento

Orfeu
Algumas lendas atribuem a Apolo a exclusividade de profetizar e sua intervenção em oráculos de outros deuses ou heróis, obrigando-os a se calarem. Conta-se, por exemplo, que após a morte de Orfeu, mesmo com seu corpo despedaçado e seus membros espalhados pelo mar, sua cabeça ainda continuava a murmurar um maravilhoso canto; levada pelas ondas, ela foi parar em Smirna, ou em Lesbos, onde foi enterrada; e dali passou a transmitir oráculos desde a época de Tróia, anunciando eventos extraordinários. Isso despertou o ciúme de Apolo, que obrigou o oráculo a se calar, alegando que Orfeu já tinha falado bastante durante sua vida.

O caso de Orfeu não é o único na Grécia. Na Etólia, o espectro de Polícrito devora o seu filho, deixando apenas a sua cabeça. Exposta no mercado, ela prediz aos etolianos, em guerra contra os acarnianos, que eles perderão a batalha; como os etolianos tinham intenção de consultar o oráculo de Apolo em Delfos, ela os proíbe de fazê-lo, e lhes ordena que a deixem à luz do sol, e jamais a esconder debaixo da terra. A lenda deste Polícrito tem com a de Orfeu um traço comum: em ambos os casos, Apolo desempenha um papel hostil; como ele silenciou o oráculo de Orfeu, a cabeça do filho de Polícrito se acautela proibindo os etolianos de consultá-lo. Em ambos os casos, Apolo está em conexão com a cabeça oracular. Isso não deixa dúvidas de que até mesmo os antigos oráculos constituídos por uma cabeça humana foram suplantados pelo de Apolo.

O pai de Apolo, Zeus, era também um deus ciumento, como o atesta o caso de Summanus, deus do céu noturno, que era adorado no Capitólio, onde tinha uma capela com sua estátua de barro. Sua cabeça foi tão violentamente atingida por um raio enviado por Zeus que ela foi precipitada no leito do rio Tibre.


Bibliografia

Bira Câmara, “Oráculos, Adivinhação e Profecias na Antiguidade”, capítulo VI
Mircea Eliade, Hist. das Crenças e das Idéias Religiosas, Tomo I, vol. 2,, pág. 103.
Waldemar Deonna, Orphée et l’oracle de la tête coupée,Revue des Études Grecques, Année 1925, Vol. 38 N° 174 pp. 44-69

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