A síntese hermética de Pico


Pico de la Mirandola (1463-1494), sábio italiano contemporâneo de Ficino, foi influenciado por suas idéias e acabou propondo uma síntese entre a magia naturalis e a cabala. Estudioso do hebraico, quando ainda tinha vinte e quatro anos de idade empreendeu a síntese total de todos os conhecimentos de sua época. 





Embora a sua magia fosse basicamente a mesma de Ficino, ele acreditava que era superior porque buscava entrar em contato com as forças espirituais mais elevadas, além das forças naturais do cosmos. A cabala invoca anjos, arcanjos, os dez sefirots (nomes ou forças de Deus) e o próprio Deus, recorrendo à magia e, sobretudo, à força do sagrado idioma hebraico. No entender de Pico, o conhecimento cabalístico era uma sabedoria mais sagrada e superior ao hermético, porque hebraica, além de confirmar a verdade do cristianismo.

De nada adiantou para Pico, tentar distinguir a sua magia cabalística da necromancia, ou magia demoníaca: devido à suspeita de heresia em suas teses, em 1487 o papa Inocêncio VIII designou uma comissão de teólogos para examiná-las. Como era de se esperar, várias de suas teses foram categoricamente condenadas e Pico teve de retratar-se. A publicação de sua obra foi proibida, mas o papa absolveu-o em consideração à sua submissão. Mesmo assim Pico fugiu para a França, onde suas idéias tinham mais aceitação, mas acabou encarcerado pelos emissários do clero na torre do Castelo de Vincennes.

Como Ficino, ele contava com a proteção de uma figura importante na Itália, Lorenzo de Médici, que intercedeu por ele junto ao papa, e permitiu que pudesse voltar à Florença. Em 1492, com Alexandre VI, o papa Bórgia, sucedendo Inocêncio, a sua situação melhorou. Este papa, um notório simpatizante da astrologia e da magia, absolveu-o completamente da acusação de heresia em 1493, e Pico pôde terminar seus dias levando uma existência de extrema piedade e ascetismo.

Mesmo simpatizante do hermetismo, procurou fazer distinção entre astronomia e astrologia, que não via com bons olhos por razões pessoais: na sua própria família havia assistido ao fiasco lamentável de algumas previsões astrológicas. Mas paradoxalmente a obra em que expôs sua magia, Conclusiones, era largamente colorida pela astrologia. Escreveu também, um ano antes de sua morte, um volumoso livro com o título de Disputationes adversus astrologiam divinatricem. Nela, combateu a astrologia divinatória e a crença de que o destino do homem possa ser determinado pelas estrelas.

Tentou refutar a astrologia estatisticamente, observando por 130 dias consecutivos a predição do tempo feita pelos astrólogos e constatou que estes só tinham acertado seis vezes... Por causa disso, foi chamado de “flagelo da astrologia” e morreu aos 31 anos de idade, como três astrólogos diferentes tinham predito, exatamente no instante em que Marte no seu horóscopo entrava na casa da morte. Segundo consta, um deles, chamado Bellanti, chegou a acertar o dia e a hora. Mas, como era odiado por todos os praticantes desta arte, era bem provável que eles se apressassem a predizer sua morte, o mais rápido possível.


Ao morrer, envenenado pelo seu secretário Cristovam de Casalmaggiore, a serviço de seus inimigos, Pico tinha quase concluída a sua obra “Astrologia Judiciária”.


Fontes:

Enciclopédia Luso Brasileira de Cultura, Ed. Verbo, Lisboa, 1984
Frances Yates, “Giordano Bruno e a Tradição Hermética”, Cultrix, 1987
Biografia de Pico della Mirandola, http://www.summagallicana.it/

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